domingo, 23 de dezembro de 2007

A transparência da realidade

Meu amor caminha pela chuva de verão,
enfrenta o sol do Sudeste,
ecoa pelo árido nordestino,
experimenta as lendas do Norte e
se congela no frio do Sul.

Meu amor é o terror das expectativas.
É a inconveniência embrulhada em papel de presente.
É o mau humor das segundas, o bom dia sem resposta,
o constrangimento visível na cara avermelhada.
É o esporro estridente do carro que vende pamonhas fresquinhas.
É a errante persistência do vendedor ambulante que anuncia suas maravilhosas vassouras.

É o verbo mal conjugado, julgado e interpretado.
É o balanço da contabilidade que não fecha ao final do mês.
É a repetência escolar.

Meu amor não encontra explicações na filosofia
ou interpretações na mitologia grega.
Ele é de carne e osso, alma e coração.
Não causa insônia, provoca sonhos delirantes.

Ele não se propaga no tempo.
É o desencanto da realidade.
Não busca espaço na vida alheia.
É a negação do medo.
É a exaltação da sensibilidade.

Meu amor é impermeável. Não reciclável.
Intransponível como uma mata amazônica.
Nasce da inocência, cresce através da gentileza
e se alimenta da generosidade.

É a flauta contralto
e o violão sem cordas.
É o palhaço sem graça
e o circo sem picadeiro.
É a palavra sem sentido
e o poema sem rimas.

Meu amor não comporta amizade.
Ele não se extingue por decreto e
nem se prorroga por medida provisória.

No final, meu amor é um erro imperdoável.
Pois ele é a onda que desmanchou os castelos de areia.
É a destruição do super-homem e
o aniquilamento do cavaleiro salvador,
materializado em seu imponente cavalo branco.

Mesmo assim, seja no amanhecer do dia ou ao raiar da tarde,
Monto na negritude resplandecente da minha bicicleta
e vou pedalando junto com a morte e o renascimento
da esperança, em busca de novas ilusões e utopias.

Ao som de: “Cordas de Aço”, Cartola + "Se", Tom Zé + “Dentadura postiça” e “Eu quero mesmo”, Raul Seixas + “Chamada dos Santos Africanos” e “Preta”, Cordel do Fogo Encantado

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